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A natureza não sobrevive sem o fascínio do Homem

Turismo e Sustentabilidade Ambiental

Se a realidade nos transporta para uma fronteira marcada pelo atual estado de pandemia, a história impelia-nos a construir um mundo pré e pós COVID-19.

Se há dois anos o turismo representava um motor fundamental das economias europeias e das sociedades em via de desenvolvimento cuja única riqueza assentava na exploração turística das suas paisagens naturais, o momento que vivemos leva-nos a desesperar pelos tempos em que multidões se amontoavam em filas para invadir museus, igrejas, calçadas das aldeias, caminhos pedestres, em que miríades de turistas pisavam solos sagrados de templos naturais. Por essa pressão exercida pela indústria do turismo, vários foram os especialistas que levantaram a voz contra a massificação desta atividade e os constrangimentos provocados ao meio ambiente, clamando por leis que regulassem a atividade turística em paisagens de extrema importância ecológica.

Em 2020 e 2021 a natureza “gozou” férias do Homem, as florestas voltaram à pacatez que caracteriza a sã convivência entre fauna e flora autóctone, livres das botas, varas, mochilas e vozes da modernidade. Mas também é verdade que a mesma natureza foi abandonada à sua sorte, os caminhos foram invadidos por vegetação que rapidamente se tornou combustível inflamável, e espécies viram o seu aumento descontrolado colocarem em causa, com semelhante impacto provocado pelo Homem, o ténue equilíbrio dos ecossistemas.

Certo é que a máquina do turismo impulsionou por largas décadas as autoridades a agirem, para que os milhares de turistas testemunhassem o esforço levado a cabo pelos governos na preservação do meio ambiente, numa espécie de marketing verde promovido pelas classes políticas. Serve como exemplo o facto de, em 2020, ter havido um aumento significativo na caça furtiva aos elefantes nos parques nacionais da Tanzânia e do Quénia. Livres dos safaris pejados de turistas (responsáveis por inúmeras denúncias às autoridades de avistamentos de caçadores ilegais), os meliantes do marfim puderam deambular livremente por entre as savanas e as nascentes à procura do “ouro branco”.

Vale a pena refletir, sem qualquer sombra de dúvida, para a necessária regulamentação do turismo, com vista a contribuir para uma sustentabilidade ambiental, paga por essa indústria que tanto peso representa para o produto interno bruto de muitos países economicamente deprimidos, que vêm na entrada de divisas a oportunidade para investirem na preservação de espécies adoradas pelas câmaras fotográficas dos turistas.

É uma janela de oportunidade que se abre o reencontro do Homem com a natureza. Cansada do bulício da cidade e da aparente artificialidade das aulas de ginástica urbana, a sociedade redescobre a paisagem e enche os caminhos junto aos rios, florestas, montanhas e charnecas, à procura do ar puro que já respiramos, quando nos primeiros passos da nossa espécie procurávamos os leitos fluviais, as árvores de fruto para garantir a evolução e o passar das eras.

De nada vale o Homem se a natureza não existir, mas a natureza também não sobreviverá sem o fascínio do Homem. É a vontade de explorar o seu berço que faz da necessidade humana a vontade de discutir a continuidade sustentada da natureza, face à pressão do pó dos dias. Nunca evoluímos tanto na construção de uma consciência ambiental e isso prova-se no aumento, ano após, do esforço de reciclagem dos resíduos, no ensino da ecologia nas escolas, nas campanhas de sensibilização para a preservação do meio ambiente mas também no direito dos animais, factos que, até há bem pouco tempo, não passavam de miragem e de uma vontade efémera demonstrada por um punhado de indivíduos avant-garde, vestidos com roupas coloridas e fitas na cabeça.

Pelo mundo industrializado, mas também em alguns dos países em desenvolvimento, vamos assistindo à criação de reservas de proteção da vida animal e da flora, a uma discussão cada vez mais séria dos Estados sobre as questões relacionadas com as alterações climáticas e o real impacto da pegada humana no futuro sustentável da vida na terra.

Cabe-nos encontrar o equilíbrio fundamental entre a nossa necessidade de escapar para os “braços” da mãe-natureza e a urgência em preservar o único lar que conhecemos.

 

Autor | Artur Filipe dos Santos, doutorado em Comunicação e Património pela Universidade de Vigo, é professor universitário e investigador no ISLA-Instituto Politécnico de Gestão e Tecnologia e membro do ICOMOS - International Council of Monuments and Sites. Especialista do património cultural e dos Caminhos de Santiago, é o autor do blogue “O Meu Caminho de Santiago” e autor de vários artigos e palestras sobre a tradição jacobeia.


Dos Santos, Artur Filipe (2021). A natureza não sobrevive sem o fascínio do Homem. Disponível em https://www.draft-worldmagazine.com/post/a-natureza-nao-sobrevive-sem-o-fascinio-do-homem

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